quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Os Lopes, da Romeira


À semelhança das fábricas do Papel e «do Meio» também a Fábrica Nova da Romeira se instalou no sítio de uma antiga azenha de moer cereais, chamada «da Romeira». Fundada por Francisco José Lopes, bracarense de nascimento e comerciante em Lisboa, a sua edificação iniciou-se em fins de 1870, sob um projeto do engenheiro francês Filipe Linder. Iniciou a laboração em Setembro de 1872. Equipada com motores hidráulicos e de vapor, começou por fabricar barretes, sapatos, xales, coberjões, cobertores, casimiras e cintas, produtos com que alcançará medalhas de ouro e de prata na exposição promovida, em 1888, pela Associação Industrial Portuguesa.
Em 1881 empregava 181 operários, entre homens, mulheres e menores. Em 1892 esse número tinha ascendido a 280.
Francisco José Lopes nascera na freguesia de Adaúfe, concelho de Braga, filho de Custódio António Lopes de Oliveira e de Francisca Fernandes, «pessoas pouco abastadas», segundo Guilherme João Carlos Henriques, que nos informa assim do percurso do fundador da Fábrica da Romeira:

«Começou a sua carreira comercial em Lisboa, aonde depois fundou um estabelecimento, levando para sua companhia o irmão Manuel Joaquim Lopes.
Separados os dois, no fim de pouco tempo, Francisco José Lopes continuou sozinho a exploração da sua modestíssima loja na Rua Nova da Princesa, n.º 59, aonde à força de aturado trabalho e economia conseguiu juntar uma boa fortuna. Viveu sempre celibatário, e, quando faleceu, deixou por testamento, datado de 12 de abril de 1895, aprovado pelo tabelião de Lisboa, J. B. Cardoso, o grosso dos seus haveres a seus irmãos Manuel José Lopes de Oliveira, Maria Lopes de Oliveira e Teresa de Jesus, e a sua sobrinha Maria Joaquina, filha desta. Ao outro seu irmão, Manuel Joaquim Lopes, deixou apenas umas pequenas lembranças» (A Vila de Alenquer, 1902, p. 189).

A fotografia que aqui se apresenta deve andar próxima do ano de 1880 e representa a família de Francisco José Lopes, exatamente os elementos referidos por Guilherme Henriques. Foi oferecida ao Arquivo Histórico Municipal pela família Amorim, herdeira da Fábrica da Romeira.
Está assinada por A. Solas. Alexandre Solas trabalhou no estúdio de Alexandre Ken, em Paris, vindo para Portugal em 1865 como operador da casa de fotografia Talbot, no Porto, antes de abrir o atelier Photographia Universal em Lisboa, em 1866.
Francisco José Lopes (1823-1899) é o segundo a contar da esquerda.
Junto a ele, de pé, a sobrinha, Maria Joaquina Lopes de Oliveira (1863-1896), que virá a casar, em 1891, com Júlio António de Amorim Lima (1859-1942).
Nos extremos, os irmãos, Manuel José Lopes de Oliveira (1826-1907) e Manuel Joaquim Lopes (1828-1905).
Sentadas, as irmãs, Maria Lopes de Oliveira (n. 1821) e Teresa de Jesus Lopes de Oliveira (1834-1897).
Francisco José e Manuel Joaquim foram residentes em Lisboa, os demais em Braga.
Júlio António de Amorim Lima, sobrinho por afinidade de Francisco José Lopes, virá a tornar-se, com a morte do também seu tio Manuel José Lopes de Oliveira, em 1907, proprietário da fábrica.
Depois da morte de Amorim Lima, em 1942, a fábrica continuará na posse da sua família, através da empresa Amorim Lima, Lda., até ao encerramento, no princípio da década de 1960.

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

O mais antigo documento do Arquivo Municipal

Com mais de 600 anos, esta sentença da rainha D. Filipa de Lencastre, donatária, sobre as obras da muralha do castelo de Alenquer é o documento, de interesse local, mais antigo do Arquivo Municipal.

Foi produzido em Sintra, em 6 de julho de 1405 (1443 da Era de César), e sentencia o concelho de Aldeia Galega (da Merceana) a participar nas reparações que se faziam na muralha de Alenquer.

Encontra-se transcrito e publicado por Inês Olaia, do Centro de História da Universidade de Lisboa, em Fragmenta Historica – revista do Centro de Estudos Históricos da Universidade Nova de Lisboa, n.º 6, 2018, pp. 85-87.


                   






 

quarta-feira, 25 de outubro de 2023


«OS CONSTRUTORES DA CÂMARA»



 

A fotografia não tem título. Mas tendo sido já publicada por duas vezes em obras de história local foi, numa delas intitulada, ou legendada, como «Os construtores da Câmara».

Apresenta, no verso do cartão-suporte, uma data inscrita, a lápis azul: 1888.

Apresenta, no verso, inscrito, a tinta vermelha: «Ofício 319/82», documento com que se terá agradecido a doação da fotografia por parte da direção do Museu Municipal de Alenquer ao seu doador, descendente de um dos retratados.

A fotografia não se encontra assinada nem apresenta, quer na frente, quer no verso, quaisquer indicações (manuscrita, impressa ou carimbada) que permitam determinar a autoria.

Sabe-se, no entanto, que, em 1888, se encontravam estabelecidos em Alenquer dois fotógrafos: José Tavares da Silva, pelo menos desde janeiro do mesmo ano, e José de Lemos, desde 1885. Um destes será, muito provavelmente, o autor da fotografia.

De formato retangular, impressa sobre a horizontal, mede 22,7 x 17,2 cm, encontrando-se colada num cartão-suporte com 25 x 20 cm.

Está impressa em tonalidade sépia.

Encontra-se, de uma forma geral, em bom estado de conservação.

A «Câmara» é o edifício dos Paços do Concelho, que se veio a inaugurar em 2 de janeiro de 1890 e cuja construção se iniciara em 7 de março de 1887.

Os «construtores» são os homens que, naquele momento, no âmbito das suas especializações, se ocupavam do andamento da obra.

Tem como fundo a fachada sul do edifício municipal em construção. As paredes estão levantadas e as cantarias colocadas. Os andaimes e escadas de madeira estão montados. O revestimento exterior, fingindo pedra aparelhada, ainda não existe, assim como ainda não existem janelas ou portas ou sequer as suas aduelas.

O grupo retratado é composto por 46 indivíduos, todos do sexo masculino, dispostos em forma de pirâmide, em vários níveis ou planos, para que «coubessem» todos.

De uma forma geral, procuram «imortalizar-se» com a melhor aparência possível, conscientes da solenidade do momento. A postura e os olhares austeros seguem a exigência, ou norma, de quem se faz retratar naquela época.

Apesar do contexto de trabalho, houve cuidado na indumentária. Luís Venâncio, que reproduziu esta fotografia em Alenquer, concelho multissecular e monumental, legendou-a desta forma: «Operários com trajo domingueiro posando para a posteridade, tendo por cenário o edifício da Câmara (ainda com andaimes), no qual trabalharam.»

Os planos seguem uma hierarquia, mesmo que não absolutamente rígida. No primeiro, onde se encontram as figuras mais destacadas, mas também no segundo, encontram-se os trajes mais elegantes. É nestes dois planos que se concentram mais indivíduos de chapéu, contrastando com os planos que se lhes sucedem, onde há mais indivíduos de barrete.

A maioria dos indivíduos faz-se fotografar ostentando intencionalmente ferramentas de trabalho ou outros instrumentos de identificação das suas profissões.

Assim, logo no primeiro plano, e da esquerda para a direita, podemos reconhecer o topógrafo, com o seu nível ótico ou teodolito apoiado em tripé de madeira; o projetista, com os planos na mão (aberto) e sob o braço (enrolado); os canteiros, junto a um bloco de pedra, com os seus ponteiros e macetas; os estucadores, com os seus esquadros e molde.